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sexta-feira, 3 de junho de 2011

Personagem

Uma menina magrela, bonita até, mas muito magrela! Com uma cabeleira leonina meio afogueada e rebelde, que combinava muito bem com a sua personalidade tão exuberante e teimosa quanto à cabeleira.
Era esquisita, diferente das outras meninas, não gostava muito de bonecas, gostava mesmo de andar pelo rio colhendo flores ou de ficar horas deitada ao sol. Enquanto as outras queriam ser professoras ela queria ser pianista, sem nem mesmo nunca ter visto ou ouvido um piano, ou bailarina coisa que também só sabia de ter ouvido falar. Sonhava com o mar, catar conchas na beira da praia e andar livremente sob o sol!
Amava a escola, lá era o lugar onde podia aprender o mundo e lá tinham tantos livros!
Cantava e dançava pela casa todo o tempo, isso quando não estava dentro do guarda roupas lendo escondida! Livro que encontrava pela casa, devorava.
A menina magrela cresceu e continuou esquisita. Os cabelos agora já não eram tão compridos, mas, não menos rebeldes. Tinha um estilo próprio de vestir, pintava os tênis, inventava bolsas, cortava calças e camisetas. Andava assim, sempre avoada, com um livro aberto lendo pelo meio da rua.
Vivia intensamente todas as histórias, leu meu pé de laranja lima e teve um pessegueiro que falava, leu as brumas de Avalon e acreditou que sim, deus era mesmo uma mulher, leu a insustentável leveza do ser e apaixonou-se por Tomas... e viveu tantos e todos os personagens, amou todos e tantos livros
A menina um pouco crescida foi atropelada na rua enquanto andava com um livro aberto pela rua. Atropelada por uma bicicleta Peugeot branca e assim teve sua vida toda, atropelada! Teve que viver um personagem real, um romance real em um mundo real.
Hoje, a menina não se reconhece quando se vê no espelho, ali refletida há uma mulher, a cabeleira agora domada, mas a personalidade é ainda rebelde e teimosa, acrescida de traços de personalidades dos personagens lidos! Não anda mais por ai avoada com um livro aberto, anda num Peugeot branco, com alguém que sempre chama sua atenção quando percebe que ela vai se distrair e sair por ai esquecendo as coisas. Continua esquisita e ainda vive o que lê!
Não é pianista, nem bailarina é professora!

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